Ética e preocupação social. Esta empresa africana não é cega pelos lucros. Sabe porquê?

Economia Internacional

Quando se diz que uma empresa deve ser socialmente responsável vem logo à cabeça uma lista de exigências. Entre elas está a implementação de boas práticas laborais, assim como de processos e produtos ambientalmente sustentáveis, a que se junta um foco em ajudar a comunidade local em que está inserida. O lucro vem depois. No Quénia existe uma empresa têxtil que procura fazer a diferença, apoiando famílias e os agricultores locais. Um exemplo para o continente africano.

A Tosheka Textiles é conhecida por ser uma empresa direccionada para o empreendedorismo social. O negócio foi fundado no condado de Makueni, na cidade de Wote, situada numa área semiárida do Sudeste do Quénia.

Inicialmente, a empresa era aquilo a que se chama de Organização Comunitária Local, ou seja, um projecto em que as pessoas que vivem próximas entre si, numa determinada zona, juntam-se para criar um organismo que vai desenvolver acções que servem o interesse de todos.

Essencialmente, a organização cultivava algodão e fazia, depois, a ponte entre a fase de colheita e a cadeia de produção. As três amigas fundadoras, Lucy, Cynthia e Christina tentaram conciliar a oportunidade de lucro com a necessidade social, ajudando e mantendo várias famílias a trabalhar no projecto.

A ideia acabou, com o passar do tempo, por converter-se numa produção têxtil “verde”, amiga do ambiente, trabalhando com materiais reciclados, fibras naturais e corantes ecológicos. A Tosheka estabeleceu o forte compromisso de ser uma marca de têxteis que se foca nas preocupações ecológicas e éticas.

Esta mentalidade, que vira as costas à cegueira pelo lucro, implica usar práticas laborais justas, com o fim de proporcionar receitas adequadas aos trabalhadores, bem como aplicar técnicas que preservem as culturas, tais como as técnicas tradicionais quenianas de tecelagem, malha e croché.

Para criar a empresa as fundadoras inspiraram-se no artesanato tradicional do Quénia, assim como nos conhecimentos técnicos que permitem uma produção têxtil “verde”. Isto foi conseguido através da fusão de desenhos tradicionais do país com um design contemporâneo, com o propósito de criar produtos que respeitassem o ambiente e fosse, ao mesmo tempo, atraentes para os consumidores.

Optar pelos bichos-da-seda para “fintar” a seca

De modo a gerar um maior retorno para os seus parceiros – os agricultores – e criar produtos de escoamento rápido, a Tosheka Textiles deixou de usar o algodão e recorreu a bichos-da-seda. A seda produzida por estes animais passou a ser, portanto, o tecido em que a empresa aposta.

O algodão, como fonte de lucro, não era sustentável e os preços eram bastante baixos. A mais-valia dos bichos-da-seda é que estes podem produzir durante todo o ano, ao contrário do algodão que está dependente das estações chuvosas que duram apenas alguns meses. Além do mais, é preciso não esquecer que os períodos de chuva diminuíram drasticamente nos últimos anos, funcionando como uma barreira para o desenvolvimento da indústria têxtil na região.

Não obstante, é também devido à seca que o bicho-da-seda da raça Mulberry, amplamente utilizada no Quénia, já não consegue produzir de acordo com os seus níveis normais. Para fintar o problema, a Tosheka introduziu uma nova raça, a Eri, que pode sobreviver nas condições de seca associadas à zona de Makueni.

A empresa foi a primeira do país a obter uma licença comercial para os bichos-da-seda Eri. Demoraram três anos a conseguir uma aprovação por parte dos órgãos governamentais, devido à necessidade de seguir procedimentos burocráticos, onde se inclui a obrigatoriedade de fazer avaliações éticas.

As peças desenhadas inspiram-se na cultura de antigas tribos

Entretanto, a organização está também a criar modelos de operação e a estabelecer procedimentos-padrão, as quais serão as bases de funcionamento da Tosheka Textiles. Estes pilares fundamentais incluem o treino dos agricultores, a criação e utilização dos bichos-da-seda Eri e a avaliação da qualidade da seda produzida.

E que produtos lançaram para o mercado, até ao momento? Aqui, o destaque vai para a “Woven Love”, uma colecção de bolsas e têxteis cujo design se inspira na cultura dos Kamba, uma antiga tribo Bantu do Sudeste do Quénia.

“Woven Love”

Mas também existe, à venda, produtos feitos com base na tradição da cestaria, com os teares da Tosheka a usarem plantas e fibras naturais, criando-se, no processo, novos têxteis e tecidos que vão ser aplicados nos objectos criados. Esta colecção inclui bolsas de pano reciclado e malas feitas de várias fibras naturais e tecido de tapeçaria.

Foco ainda para a colecção “Tesouros Reciclados”, que consiste em elegantes malas artesanais, de design contemporâneo, feitas a partir de sacos de plástico reciclado, material que é depois entrelaçado com outras fibras naturais. E, também, para a “Safi Tosheka”, que compreende mercadorias de couro de alta qualidade, adornadas com tecido tradicional tingido e outros tecidos locais.

“Safi Tosheka”

Actualmente, a Tosheka Textiles emprega principalmente mulheres. Existem 200 trabalhadoras envolvidas no fabrico dos seus vários produtos, existindo planos para expandir a sua força de trabalho em Makueni. Até onde crescerá a empresa?

 

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